Aprendemos da Igreja que o Espírito Santo derrama os seus dons sobre todo o povo de Deus. Referimo-nos a sete dons – sabedoria, entendimento, conselho, fortaleza, ciência, piedade e temor de Deus –, número que significa perfeição, mas o Espírito age onde quer e como quer! As celebrações da Crisma, e são muitas que ocorrem neste final de ano, são sempre uma festa do derramamento dos grandes presentes que Deus concede a adolescentes, jovens e adultos através da graça desse Sacramento.
Do Espírito Santo são os frutos a serem colhidos da árvore viva que somos todos nós, cristãos, a saber, “o amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, lealdade, mansidão, domínio próprio” (Gl 5, 22-23), E São Paulo apresenta os carismas, serviços e ministérios nascidos do mesmo Espírito Santo, que conduz a Igreja chamando-os também de dons: “Há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. Há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. Há diferentes atividades, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos. A cada um é dada a manifestação do Espírito, em vista do bem de todos. A um é dada pelo Espírito uma palavra de sabedoria; a outro, uma palavra de conhecimento segundo o mesmo Espírito. A outro é dada a fé, pelo mesmo Espírito. A outro são dados dons de cura, pelo mesmo Espírito. A outro, o poder de fazer milagres. A outro, a profecia. A outro, o discernimento dos espíritos. A outro, diversidade de línguas. A outro, o dom de as interpretar. Todas essas coisas as realiza um e o mesmo Espírito, que distribui a cada um conforme quer” (1 Cor 12, 4-11; Cf. Rm 12, 1-8). E São Paulo agrega aos muitos dons e ministérios aquele que a todos supera e resume, o amor de caridade (1Cor 13, 1-13).
Aproximando-nos do final do ano litúrgico, a Igreja nos oferece a Parábola dos Talentos (Mt 25, 14-30). Antes de referir-se às capacidades de cada pessoa, a parábola quer ensinar-nos a assumir as tarefas que nos são confiadas durante a vida, chamando-nos à responsabilidade, enquanto esperamos a vinda do Senhor, que retornará depois de muito tempo (Cf. Mt 25, 19). Os cristãos estejam comprometidos no cumprimento efetivo de sua missão, todos os deveres de sua vida quotidiana, buscar a cada dia a vontade de Deus, o melhor modo para estar vigilantes à espera do Senhor.
Entretanto, o Evangelho dos talentos pode conduzir-nos, sim, a refletir sobre os muitos dons, talentos, ministérios e serviços que nos são confiados. A Liturgia da Palavra do XXIII Domingo do Tempo Comum começa com uma simpática figura feminina (Pr 31, 1-31), uma mulher operosa, generosa, ativa, nunca indolente ou preguiçosa, sempre atenta às necessidades dos outros, dedicada ao amor ao próximo e ao temor de Deus. Ela é um retrato da sabedoria! Saber viver com sabedoria, convite e desafio para todos nós, identificando o gosto – sabor que Deus pôs em cada acontecimento!
Durante a vida, recebemos muito de Deus, e são tantos os instrumentos que ele utiliza para nos prodigalizar com seus dons. Podemos identificar, pedindo a ação do Espírito Santo em nosso coração e em nossa mente, quais são os dons espirituais e intelectuais, assim como todas as capacidades que nos foram oferecidas. Os três servos da Parábola receberam muito. Um talento correspondia ao ganho por seis mil dias de trabalho. Cinco talentos equivaleria ao salário de quase cem anos de trabalho de um operário. O “exagero” da parábola é proposital! Cada um recebe de acordo com suas possibilidades, e ninguém pode enterrar o talento, deixar de empenhar-se durante a vida. O Senhor quer que sejamos servos permanentemente vigilantes, o que significa estar prontos (Cf. Mt 25, 10). Ninguém se entregue ao ciúme ou a inveja diante do que os outros receberam de Deus. As capacidades concedidas a cada um sejam efetivamente reconhecidas e correspondidas com ação de graças.
Reconhecer e valorizar o que Deus concedeu aos outros é sabedoria! A vida da Igreja é feita com todos os dons concedidos. É necessário edificar-nos mutuamente, colocando em relevo o que receberam as outras pessoas. Há um gesto, e a palavra vem junto, extremamente importante, saber elogiar o que fazem as outras pessoas. Pode nascer até uma sadia competição de reconhecimento, valorizando o que existe nas famílias e nas comunidades.
Outro passo importante é fazer bem todas as coisas. De Jesus, cheios de admiração, todos diziam: “Tudo ele tem feito bem. Faz os surdos ouvirem e os mudos falarem” (Mc 7, 37). A algumas pessoas Deus pode conceder o dom de milagres, fatos extraordinários, mas a todos ele concede o milagre de fazer bem cada coisa, com capricho, dignidade e seriedade. Dentre tantos exemplos, ocorre-me referir-me a quem faz os bonecos e brinquedos de miriti, tão significativos em nossa região, com a criatividade que edifica, verdadeira obra de arte. E obra de arte pode ser o nosso dia a dia. Gostar de nossa casa, arrumá-la bem, ter bom gosto no vestir e no comportar-se, construir verdadeira harmonia em torno a nós, apurar nossa linguagem, nossos cumprimentos, o olhar de atenção às pessoas que nos cercam, e daí por diante!
A todos nós o Senhor atribui, pela ação do Espírito, capacidades para servir à Igreja e ao próximo na Igreja. Nossas Comunidades e Paróquias têm lugar para todos, e ninguém precisa se excluir ou se esconder. Quando Pároco numa região do interior de Minas, uma Comunidade devia escolher seu coordenador e ministro da Palavra. O que foi indicado, homem cheio de sabedoria, tentou esquivar-se, demorando para dizer o verdadeiro motivo, o analfabetismo. Edificou-me e a toda a Comunidade, quando a filha daquele senhor, de apenas nove anos, se dispôs a alfabetizar o pai durante a semana com o Evangelho do domingo subsequente. E aquele homem aprendeu a ler com a filha, ajuntando tudo com a sabedoria que já lhe tinha sido dada pelo Espírito Santo!
É ainda São Paulo que nos ajuda a valorizar a beleza do corpo de Cristo que é a Igreja, do qual todos somos parte: “Se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele; se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele. Vós todos sois o corpo de Cristo e sois membros desse corpo.” (Cf. 1Cor 12, 26-27).
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.