“Jesus deixou Nazaré e foi morar em Cafarnaum (Cf. Mt 4,12-23), às margens do mar da Galileia, no território de Zabulon e de Neftali, para cumprir-se o que foi dito pelo profeta Isaías: ‘Terra de Zabulon, terra de Neftali, caminho do mar, região além do Jordão, Galileia, entregue às nações pagãs! O povo que estava nas trevas viu uma grande luz, para os habitantes da região sombria da morte uma luz surgiu’” (Is 8,23-9,3). O início da vida pública de Jesus aconteceu no meio das periferias geográficas e humanas da época. Foi viver entre aqueles que eram rejeitados por causa vizinhança com os pagãos. Era gente de fronteira aquela que ele preferiu. Os que andavam oprimidos sob o jugo encontram nele a alegria e a felicidade. Por isso o povo acorre ao Senhor, deseja sua palavra, sua sabedoria, seus gestos e seu extraordinário amor. De fato, “Jesus percorria toda a Galileia, ensinando nas sinagogas deles, anunciando a Boa-Nova do Reino e curando toda espécie de doença e enfermidade do povo. Sua fama também se espalhou por toda a Síria. Levaram-lhe todos os doentes, sofrendo de diversas enfermidades e tormentos: possessos, epiléticos e paralíticos. E ele os curava. Grandes multidões o acompanhavam, vindas da Galileia, da Decápole, de Jerusalém, da Judeia e da região do outro lado do Jordão” (Mt 4,23-25). Preferiu os mais pobres e sofredores, sem deixar de lado nenhum tipo de pessoa que encontrava pela estrada!
A partir de então, Jesus começou a anunciar: “Convertei-vos, pois o Reino dos Céus está próximo”. A proximidade do Reino de Deus não pode ser reduzida a uma chegada iminente ou distante, mas há de ser compreendida como vizinhança. Sim, o Reino já chegou, é ele mesmo que está diante de cada pessoa tocada pela sua presença e pela Palavra. O Reino mora ao nosso lado e já está também presente em nosso coração e dentro dos outros, mesmo aqueles que eventualmente julguemos distantes de Deus! Diante dele, nada mais pode ser feito senão converter-se, mudar de mentalidade e de rumo na vida. É bom tomar consciência de que todos nós, sem exceção, somos chamados a uma contínua mudança. Até o fim de nossa caminhada nesta terra haverá recônditos em nosso interior a serem povoados pelos valores do Reino de Deus, o que pede sempre abertura para mudar, e mudar para melhor, pois quem para já está regredindo!
Podemos voltar ao Evangelho: “Caminhando à beira do mar da Galileia, Jesus viu dois irmãos: Simão, chamado Pedro, e seu irmão André. Estavam jogando as redes ao mar, pois eram pescadores. Jesus disse-lhes: ‘Segui-me, e eu farei de vós pescadores de homens’. Eles, imediatamente, deixaram as redes e o seguiram. Prosseguindo adiante, viu outros dois irmãos: Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João. Estavam no barco, com seu pai Zebedeu, consertando as redes. Ele os chamou. Deixando imediatamente o barco e o pai, eles o seguiram” (Mt 4, 21-22). O Senhor convoca ao discipulado pessoas que encontra pelo caminho. Podem ser pescadores, outros são cobradores de impostos, homens do campo e da cidade. Vale a pena fazer a lista dos nomes e circunstâncias com os quais foram chamadas tantas pessoas. A categoria em que se incluem é a de discípulo! Lá no profeta Isaías encontramos uma simpática descrição de tais pessoas: “O Senhor Deus deu-me a língua de um discípulo para que eu saiba reconfortar pela palavra o que está abatido. Cada manhã ele desperta meus ouvidos para que escute como discípulo; o Senhor Deus abriu-me o ouvido e eu não relutei, não me esquivei” (Is 50, 4-5).
Discípulo é muito mais do que aluno, pois se dispõe a seguir passo a passo seu mestre, aprende com suas palavras e com sua vida, pronto a conformar seus pensamentos e atitudes com aquele que foi descoberto e por quem foi chamado. É um relacionamento profundo, que toca toda a vida. E somos também nós chamados a tal aventura! Para tanto, faz-se necessário ter coração aberto! Se muita coisa vai entrar em nossa cabeça, passando pelo filtro de nossa inteligência, é bom saber que o discipulado começa mais no coração. Trata-se de uma sintonia profunda e gratuita que se estabelece com o Senhor! Sua fonte é a graça, pois o chamado é feito por ele, nas moções que o Espírito lança, quais dardos de amor, em nossa direção. E o discípulo, mais coração do que cabeça, depois entenderá as razões de sua esperança e será capaz de explicá-las (Cf. 1Pd 3, 15). Discípulo é primeiro aquele que sabe ouvir, ouve de verdade, presta atenção, guarda no coração.
Depois o discípulo que escutou o Senhor descobrirá que é sua tarefa comunicar aos outros a experiência feita. Torna-se missionário, capaz de consolar os outros. Desenvolve em si uma sensibilidade especial, olhando permanentemente ao seu redor, para descobrir o bem que é capaz de fazer. E todos os discípulos de Jesus podem e devem ser de alguma forma missionários. A próxima Campanha da Fraternidade sobre “Fraternidade e vida: dom e compromisso” traz três palavras correspondentes a gestos com os quais o discípulo pode comprometer-se: “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (Cf. Lc 10, 33-34). Abrir os olhos, ver o que acontece, compadecer-se das diversas situações humanas, fazer alguma coisa! Uma pessoa pode rezar, outra pode ir ao encontro dos mais pobres, outra se apaixona pelas situações mais dolorosas da sociedade, um jovem aceita ser voluntário, outro vai como missionário a lugares distantes, aquela outra pessoa começa a cuidar da própria vizinhança com caridade e atenção.
Para que a Igreja tenha suas portas abertas e possamos trazer a alegria às nossas cidades, faz-se necessário desenvolver uma nova sensibilidade, a capacidade de prestar atenção, o acolhimento dos apelos feitos pela Igreja. Ouvir e sair de si, fazer alguma coisa, abrir o coração. Já ouvimos muitas vezes que ninguém é tão pobre que não tenha nada a oferecer e ninguém é tão rico que não tenha nada a receber! É hora de escuta, é tempo de missão! Mãos à obra!
Rezemos! Deus eterno e todo-poderoso, dirigi nossa vida segundo o vosso amor, para que possamos, em nome do vosso Filho, frutificar em boas obras. Amém.
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.