Muitos judeus traziam bordados na orla de sua roupa, ou portavam faixas na cabeça e na testa com palavras que sintetizavam a fé professada, o “Shemá Israel”: “Ouve, Israel! O Senhor nosso Deus é um só. Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com toda a tua força!” Jesus completa tudo: “E o segundo mandamento é: Amarás teu próximo como a ti mesmo! Não existe outro mandamento maior do que estes!” (Mc 12, 28-31). O diálogo continua, com o doutor da lei repetindo as mesmas palavras.
O “Ouve, Israel” comporta certamente uma atenção diferente e redobrada diante do Senhor, que se estende a todo o trato com as palavras santas da Escritura. Em seguida, o leitor atento se surpreende, quem sabe com brilho nos olhos, para depois escancarar suas expressões de júbilo diante daquilo que a Palavra lhe mostra! Este exercício pode e deve ser também nosso.
Jesus, mesmo estando diante de um doutor da lei, e sabemos como estes o confrontaram e perseguiram, usa uma expressão surpreendente, que assumimos para compreender e praticar: “Tu não estás longe do Reino de Deus!”
Abramos o nosso horizonte! Os cristãos são perto de 2,3 bilhões da humanidade que está com cerca de 7,753 bilhões de habitantes. Os Cristãos (33% da população), entre Católicos (1,329 bilhão de fiéis), Evangélicos ou Protestantes e os Ortodoxos. São dados a serem permanentemente atualizados, inclusive pelo fato de o número de Católicos ter crescido no ano passado. Dá para ver com clareza que deveremos ainda fazer muito esforço para que a humanidade toda conheça o nome de Jesus, sabendo que todos têm este direito.
Olhando bem longe, descobriremos em pessoas que nem mesmo têm uma fé religiosa valores que reconhecemos terem sido plantados pelo Espírito Santo, como sementes preciosas. Olhemos para quem está mais distante, e às vezes mora ao lado de nossa casa, para identificar gestos de serviço, capacidade para conversar com os outros e muitos gestos edificantes. Podemos ainda pensar e valorizar a verdadeira ânsia pela verdade, perguntas sinceras, busca de livros e conhecimento. A primeira escuta seja diante de quem está mais longe. Certamente ouviremos conceitos diferentes ou opostos, mas podemos aceitar o desafio para ver que em qualquer conversa, algo de bom encontraremos.
Chegando mais perto, encontraremos os que professam alguma religião, e aqui é grande a diversidade. Entre nós estão presentes religiões de matriz africana, com núcleos de atividade muito significativos. Toda a Amazônia tem atuantes ou que influenciam nossa prática religiosa, as expressões das populações indígenas. Outros grupos são de origem asiática. Muito presente entre a nossa população está o espiritismo, com o qual também é possível dialogar. Em todas estas manifestações religiosas encontramos sementes do Verbo de Deus plantadas pelo Espírito Santo.
Mais perto encontraremos as Igrejas e Comunidades Cristãs que têm o Batismo, a fé na Santíssima Trindade, a Sagrada Escritura. Com estas comunidades podemos compartilhar inclusive o impulso missionário, para estabelecer contato com as várias situações existentes numa sociedade variada e pluralista como a nossa.
Faz-se necessário acrescentar que nenhum cristão haverá de sentir-se bem com o proselitismo, quando parece que as pessoas estão fazendo mais propaganda de algum produto do que dar testemunho. Haveremos ainda de ter clareza para não fazer sincretismo, com mistura de vários elementos cristãos ou não cristãos, para criar manifestações religiosas. Não só os católicos, mas também os que são de outras igrejas ou comunidades cristãs, assim como quem professa outra religião e ainda quem não tem convicção religiosa, todos poderão dialogar, envidar juntos esforços pelo bem comum se cada pessoa ou grupo permanecer fiel à sua própria fé.
E bem perto de nós está o escândalo da pobreza e da miséria, a droga, a violência e tantas manifestações de criminalidade. Muitos de nós já tiveram oportunidade de diálogo frutuoso com as populações de rua. Atrás de uma barba por fazer, ou vestidos rotos e sujos, ali se encontra tantas vezes, e mais vezes do que se pode pensar, a sabedoria, convicções religiosas, dramas até diminuídos justamente porque o Reino de Deus passa, com sua presença, por todas as vielas do mundo.
Nossa vida de Igreja precisa crescer em sua dimensão de inclusão. Mais presença no meio da pobreza e dos pobres, maior diálogo ecumênico e inter-religioso, maior diálogo com a cultura desafiadora de nosso tempo, para dizer a tantas pessoas e situações que não estão longe do Reino de Deus!
Enfim, tenho diante dos olhos as multidões do Círio de Nazaré. Pude percorrer, na única procissão que nos foi permitido realizar, assim como no sábado da transladação e no domingo, rostos de todo tipo, pessoas que contemplavam a Imagem Peregrina, lágrimas e sorrisos. Uma pessoa agradecia a Deus me dizia de sua alegria, porque tinha receio de que sua criança, pelos limites impostos pela pandemia, viesse a crescer sem conhecer de perto a Santinha! A meu ver, milhares de mãos elevadas de crianças no colo dos pais, ou “cavalinho” sobre o pescoço dos pais eram uma iniciação à vida cristã, através das mãos carinhosas de Nossa Senhora de Nazaré. Delas é o Reino dos Céus!
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.