A escola com a qual Jesus formou seus discípulos acontece ao longo do caminho, aproveitando os encontros com as pessoas e as eventuais falhas e perguntas de seus escolhidos (Mc 9, 30-37). O ambiente é da Galileia, vizinhança do paganismo, lugar provocante e desafiador para todos. Os discípulos tinham sido chamados, em sua maior parte, dentre a população das pequenas aldeias da região, vários deles pescadores curtidos pelo vento, o sol e o trabalho, portadores de muitas esperanças, cultivadas por séculos por todo o povo de Deus. Eram alunos de uma escola, destinados a amadurecerem como discípulos e apóstolos.
O Mestre não quer propaganda, mas convivência respeitosa dos processos vividos pelo seu grupo de aprendizes de apostolado. Era tempo de cuidado especial com aqueles que escolhera. A eles, mais uma vez anuncia Jesus a dura realidade da paixão, morte e ressurreição. Era grande a dificuldade que para entender esta etapa da formação, pois o projeto que traziam na mente era diferente, pela situação de opressão e sofrimento vivida por todo o povo da época. Era, como dizemos hoje, um grande “sufoco” que aguardava uma saída, e eles eram homens do povo, embebidos da mentalidade corrente, que os levava a aguardar um libertador poderoso.
Sinal de que as pretensões incluíam um projeto de poder foi a discussão a respeito de quem era maior. Sabemos que os detalhes incluem um pedido de Tiago e João, acompanhados de uma mãe solícita, mas trazem consigo também o ciúme e a inveja do resto do grupo. Jesus lhes revela os critérios de seu Reino, com palavras diretas: “Se alguém quiser ser o primeiro, seja o último de todos, aquele que serve a todos” (Mc 9, 35). Era a inversão de tudo o que humanamente desejavam. De lá para cá, os discípulos de Jesus encontrarão sempre a oportunidade para mudar a mentalidade, o que se chama conversão!
“Em seguida, pegou uma criança, colocou-a no meio deles e, abraçando-a, disse: ‘Quem acolhe em meu nome uma destas crianças, a mim acolhe. E quem me acolhe, acolhe, não a mim, mas Àquele que me enviou'” (Mc 9, 36-37). O Senhor aponta um novo e revolucionário critério, que inclui crianças, pobres, cegos, coxos e aleijados, surdos e mudos, pecadores, marginalizados em geral, como encontramos em outras etapas da formação dos discípulos.
Não é difícil encontrar as muitas lições a serem colhidas para a escola da vida a ser percorrida em nossos dias. Quando não se vive a Palavra de Deus, quando os critérios são pautados pelo egoísmo, ou a sociedade constrói casas e estradas baseadas na exploração dos mais pobres, com a vergonhosa situação de desigualdade existente em nosso tempo, o resultado não poderia ser outro além do que estamos assistindo. Se muitos dizem que o dinheiro sumiu, é hora de perguntar sobre o seu destino! Se todos mergulharam no engano do consumo proposto nos anos recentes, agora alguém (nós!) deve pagar a conta. Infelizmente não se veem sinais de humildade e reconhecimento das falhas da parte dos responsáveis pela situação de nosso país.
A Liturgia da Igreja nos oferece, neste final de semana, palavras muito fortes, vindas da boca e da experiência de um dos apóstolos do Senhor, São Tiago (3, 16-4,3) que parecem escritas para nossos dias: “Onde há inveja e rivalidade, aí estão as desordens e toda espécie de obras más. A sabedoria, porém, que vem do alto é, antes de tudo, pura, depois pacífica, modesta, conciliadora, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade e sem fingimento. O fruto da justiça é semeado na paz, para aqueles que promovem a paz. De onde vêm as guerras? De onde vêm as brigas entre vós? Não vêm, precisamente, das paixões que estão em conflito dentro de vós? Cobiçais, mas não conseguis ter. Matais, fomentais inveja, mas não conseguis êxito. Brigais e fazeis guerra, mas não conseguis possuir. E a razão por que não possuís está em que não pedis. Pedis, sim, mas não recebeis, porque pedis mal. Pois o que pedis, só quereis esbanjá-lo nos vossos prazeres”.
As crises de toda ordem pelas quais passa nosso mundo foram plantadas pela liberdade humana, com as escolhas feitas no correr do tempo. Quando se planta egoísmo, os frutos não podem ser diferentes dos que estamos colhendo. Quando a sociedade se divide e apenas busca os culpados pelos problemas sempre do outro lado da rua, e não dentro da própria casa, as consequências vão sempre aparecer. Se nos assustam as cenas de centenas de milhares de refugiados que se movimentam hoje pela Europa, com países que precisam urgentemente acolher os mais sofredores, sabemos que os meios de comunicação mostram a cada momento um bem estar que atrai gente de toda parte. Não dá para expor ao mundo inteiro e continuar dizendo que só uns poucos continuam privilegiados. Vai continuar a invasão de povos chegados de outras regiões do mundo, trazendo seus hábitos, sua cultura, suas práticas religiosas! Os resultados vão aparecer nos próximos anos.
Pode soar ingênuo, da parte de nós cristãos, pensar ou dizer que a acirrada competição, em todos os níveis, tem gerado o quadro social de desigualdade terrível em nosso país, mas basta olhar ao redor, para identificar que as lições do caminho, oferecidas por Jesus, foram desprezadas ou esquecidas, em nome de um progresso, cujo nome é consumo, correria, prazer desenfreado, vícios de todos os tipos, liberação das drogas, corrupção deslavada, governantes irresponsáveis, que não assumem os erros cometidos. Pelo visto, a escola foi outra! E não haverá mudanças, senão naquele que é caminho, verdade e vida!
Os cristãos são chamados a acreditar na força de uma minoria feita fermento, sal e luz, e começar de novo, a cada dia! É necessário voltar à Escola de Jesus, aprender o beabá do Evangelho, começar a amar o próximo, escolher o serviço humilde, partilhar os bens, abrir-se à vida da Igreja, voltar à Comunidade Paroquial, retomar a oração diária. Receitas simples? São as lições do caminho, cheias de surpresas positivas!
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.