Em Procissão!

Nossa Liturgia é rica de procissões, assim como nossas devoções populares. Procissão de abertura das celebrações, procissão com o Evangeliário, procissão das oferendas, procissão da Comunhão. E a Semana Santa nos leva às ruas, com a celebração do Domingo de Ramos, na qual recordamos a entrada de Jesus em Jerusalém, proclamando-o bendito também em nossa cidade e em nosso coração. Recordamos os passos da Via-Sacra, passamos pelas ruas para recordar o caminho de Jesus ao Calvário e o encontro com sua Mãe. Na Sexta-feira Santa a imagem do Senhor Morto percorre as ruas da Cidade Velha, para chegar, enfim, à grande procissão da Luz, com a qual proclamamos, na Vigília Pascal, que só Jesus Cristo é a Luz para as trevas do mundo!

Nas Missas do Tempo Pascal, poderemos cantar alegres: “Em procissão vão o pão e o vinho, acompanhados de nossa devoção, pois simbolizam aquilo que ofertamos, nossa vida e nosso coração. Ao celebrar nossa Páscoa e ao vos trazer nossa oferta, fazei de nós, ó Deus de amor, imitadores do Redentor. A nossa Igreja, que é mãe, deseja que a consciência do gesto de ofertar se atualize durante toda a vida, como o Cristo se imola sobre o Altar. Eucaristia é Sacrifício, aquele mesmo que Cristo ofereceu, o mundo e homem serão reconduzidos para a nova Aliança com seu Deus. O pão e o vinho serão, em breve, o Corpo e o Sangue do Cristo Salvador. Tal alimento nos une num só Corpo, para a glória de Deus e seu louvor.” Será o ponto de chegada de nossas procissões e peregrinações pelas estradas da vida.

Neste ano, mais uma vez, pela situação sanitária em que nos encontramos, com tantos desafios e dores para a humanidade toda e para nossa Igreja, deveremos celebrar com pouca movimentação pelas ruas a nossa Semana Santa. Sem grandes procissões, queremos fazer a maior de todas, com nosso caminho verdadeiro e autêntico para a Páscoa, e dela podem todos participar, mesmo ficando em casa!

Para tanto, desejamos pedir ajuda a algumas figuras que entraram na primeira e definitiva Semana Santa, participantes do Mistério da Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor, escolhidas dentre muitas outras que cada pessoa poderá acrescentar e meditar com seus gestos de amor descritos nos Evangelhos. São pessoas notáveis ou não, algumas até discretas ou escondidas, mas lembradas aqui a fim de que ninguém de nossos dias e de cada família se sinta excluído.

Quando Jesus entrou em Jerusalém, para lá subiam as tribos do Senhor (Cf Sl 121,4), ele vem para ser entregue! Entretanto, sua chegada é festejada. Podemos imaginar a criançada gritando hosanas, os ramos e as roupas estendidas! Nossas casas muitas vezes se enfeitaram para verem passar as procissões! Mesmo sem poder sair às ruas e levantar os ramos neste ano, algum sinal seja colocado em nossas casas, para dizer que é bendito o que vem em nome do Senhor. E em nossa oração de família, Igreja doméstica e sempre aberta, peçamos a libertação da presente pandemia em nossos dias, na Jerusalém de hoje e todas as nossas cidades tão machucadas!

O jovem escondido, que seguia Jesus coberto só de um lençol, pode despertar em nós a santa curiosidade de acompanhar os acontecimentos (Mc 15,31). De um lado, pode ser sinal da debandada geral, profetizada por Amós (Am 2,14-16) que se seguiu à prisão de Jesus. Alguns até supõem que tenha sido o próprio Marcos. Sua figura pode até estar ligada ao jovem vestido de branco (Mc 16,5) que as mulheres encontraram ao chegarem ao sepulcro no primeiro dia da semana, para dizer-lhes: “Ressuscitou, não está aqui”. Entretanto, ele nos faz entrar na grande procissão da condenação de Jesus, quem sabe, às escondidas, mas presentes! Ninguém nos despreze pelas muitas perguntas que o mistério de Cristo nos provoca. E nasça em nós o desejo de sermos anunciadores da Ressurreição, com as vestes e a história que tivermos!

Os servos que levaram a água para Pilatos lavar as mãos (Mt 27,24), testemunhas do ato de covardia do governador, entraram sem querer nos relatos da condenação de Jesus. Podem ajudar-nos a superar as eventuais cumplicidades com o mal existente no mundo, pedindo perdão pela nossa displicência. É bom saber que antes o próprio Senhor recomendara aos discípulos de ontem e de sempre lavar os pés dos outros! Haja água para tais gestos de amor!

Simão Cirineu (Mc 15,21) passava pelo caminho, foi primeiro obrigado a ajudar Jesus, mas desejamos vê-lo como primeiro seguidor de Jesus: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me!” (Mc 8,34). De fato, tomou gosto pela ajuda dada a Jesus! Podemos imaginar este caminho de conversão! Com certeza, quando o Evangelho diz que era pai de Alexandre e Rufo, é sinal de que vieram a ser membros das primeiras Comunidades (Cf. Rm 16,13). Haveremos de transformar obrigações de serviço ao próximo em entrega livre e amorosa!

A tradição nos presenteou com Verônica, cujo nome significa imagem verdadeira (verdadeiro ícone!). O nome é referência à imagem do rosto de Cristo que ficou impresso no véu com o qual Verônica teria enxugado o rosto do Mestre todo ensanguentado. Tradições cristãs antiquíssimas a colocam entre as mulheres de Jerusalém às quais Jesus dirigiu um lamento quando caminhava para o Calvário (Lc 23, 27-31). De sua figura brotou a bela devoção à Sagrada Face, presente em meio ao nosso povo. Com ela desejamos reconhecer a face de Cristo e descobri-la também presente em tantos outros rostos, já que o que fizermos ao menor dos irmãos terá sido feito a ele (Mt 25,40).

No alto da Cruz, Jesus “canoniza” o Bom Ladrão (Lc 23,39-43). Jesus morreu por ele e por nós, pagando a dívida de Adão e restituindo tudo o que fora roubado por aquele que, mais esperto do que todos os ladrões, roubou o Paraíso na última hora! Basta voltar-se para Jesus, com o olhar da fé, e todo o passado fica para trás, lavado pela sua misericórdia infinita, e isso vale para todos nós!

José de Arimatéia esperava o Reino de Deus e não tinha concordado com o Sinédrio na condenação de Jesus (Lc 23,51). Discípulo do Senhor às escondidas, no momento mais difícil tem coragem de se expor e pede o corpo de Jesus, para depositá-lo num sepulcro de sua propriedade (Mt 27, 57-60; Mc 15,42-46; Lc 23,50-53; Jo 19,38-42). Com ele estava Nicodemos, que tinha se encontrado com Jesus de noite (Jo 3,1-15) e tinha tomado a defesa de Jesus diante do Sinédrio (Jo 7,50-52). O gesto dos dois perfumou o caminho do seguimento de Jesus, ungidos que somos todos, para encontrar o Cristo ressuscitado.

Após o sepultamento de Jesus, mulheres que o acompanharam desde a Galileia (Lc 23,55-56) observaram tudo e voltaram para casa, como nós que somos quase constrangidos a ficar em casa! Após o sábado, foram ao sepulcro. Vamos nós, com Maria Madalena e as outras mulheres ao sepulcro. Sairemos depois correndo, em procissão festiva, para proclamar que Ele está vivo! Saiamos de nós mesmos ao encontro de Cristo. Esta é a melhor procissão!

Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.

Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.

Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.

Dom Alberto Taveira Corrêa

Arcebispo Metropolitano de Belém

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