Bons Propósitos

​A passagem de ano nos trouxe uma avalanche de acontecimentos, cuja intensidade provou nossa capacidade de absorvê-los e tirar as lições que a Providência Divina nos oferece através dos mesmos. O Brasil se despediu de Pelé, atleta maior de nosso tempo, orgulho nacional, com referências elogiosas vindas de todas as partes. Nosso país viu a conclusão de um doloroso e exigente processo político-eleitoral, cujas marcas profundas ficaram numa sociedade hoje fragmentada, conduzindo-nos agora à posse dos governantes do País e dos Estados. Na Igreja, a partida para junto do Pai de nosso querido Papa Emérito Bento XVI. Com este fato, não vivemos um tempo de luto, mas a imensa gratidão pelo seu serviço, aquele que se declarou um humilde servo na vinha do Senhor, como Sacerdote, Bispo, Teólogo, Papa e Papa Emérito, uma das mais prodigiosas inteligências de nosso tempo, agregada à coragem inusitada de renunciar ao exercício do Pontificado, quando lhe faltavam as forças necessárias. Foi-nos possível assistir o Congresso Nacional fazendo referência respeitosa a um atleta e a Bento XVI! E participamos, como testemunhas oculares, de fatos históricos de grande relevância. Que ninguém passe em vão ao nosso lado! Nenhum acontecimento nos deixe sem lições para a vida pessoal para compartilhar com os outros!

E a Igreja preenche este tempo com os fatos da História da Salvação, concedendo-nos a oportunidade de tirar as consequências de tudo o que aconteceu quando chegou a plenitude dos tempos (Cf. Gl 4,4-7) e Deus enviou seu Filho, nascido de uma mulher. De fato, não faltam as luzes provindas de nossa fé para entender os mistérios de Deus que penetram na história humana. Depois do acontecimento do Nascimento de Jesus Cristo, recordado até pelos que não creem nele, ao datar documentos e acertar o calendário, fazendo com que este seja o ano da graça de dois mil e vinte e três do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, a Liturgia oferece três celebrações, neste ano aproximadas em sequência direta, com a tônica da “manifestação” de Jesus Cristo ao mundo. Nós as chamamos de “Teofanias”, pois Deus vem à vida pública para suscitar a fé. No dia sete de janeiro, as Bodas de Caná (Jo 2,1-11). No Domingo, oito de janeiro, a Epifania, Dia de Reis (Mt 2,1-12). Na segunda-feira, dia nove de janeiro, a Festa do Batismo do Senhor (Mt 3,13-17). Os acontecimentos podem estar distantes no tempo humano, mas o Tempo Litúrgico os aproxima e nos inspira bons propósitos para o ano que começa.

Os Reis Magos saíram do longínquo oriente, conduzidos pela estrela, símbolo da consciência presente em toda pessoa humana, que aponta para o bem e para Deus. Para este ano, como propósito, comecemos a ouvir esta voz que grita silenciosamente dentro de cada pessoa. Muitas cabeçadas acontecem quando, teimosos que somos, acabamos pondo a mão no fogo, mesmo sabendo que fogo queima! Muitos problemas poderiam ser evitados se o discernimento fosse feito antes das decisões! Dos Magos que levaram Ouro a Jesus, aprendemos ainda a abrir os bolsos para partilhar os bens que possuímos. Temos a certeza de que mais generosidade pode ajudar a resolver problemas, como, por exemplo, a fome e a miséria em tantas partes. Desejamos com eles oferecer com mais dedicação o incenso de nossa Oração. Mais tempo e mais qualidade de vida espiritual! E aqueles homens, oferecendo a Mirra, ainda nos ajudam a tomar consciência de nossos limites, pois o sofrimento e a morte, mais cedo ou mais tarde, também a nós hão de chegar! Ninguém vai ficar para semente, e é melhor estar sempre preparados.

Mais adiante, assim nos narra o Evangelho: “Depois de ser batizado, Jesus saiu logo da água, e o céu se abriu. E ele viu o Espírito de Deus descer, como uma pomba, e vir sobre ele. E do céu veio uma voz que dizia: ‘Este é o meu Filho amado; nele está o meu agrado’” (Mt 3,16-17). Na Festa do Batismo do Senhor, queremos preencher todos os dias do ano com a escuta da Palavra de Deus, a abertura ao Espírito Santo que nos conduz com seus dons e suscita frutos de vida e santidade. Sabendo que Jesus tem todo o agrado do Pai, tomamos a decisão de segui-lo num discipulado fiel e dedicado neste ano, fazendo de nossa vida o seguimento dos rastros deixados por seus passos, como aqueles primeiros chamados pelas estradas da Galileia.

E feitos discípulos de Jesus, vamos com ele a Caná da Galileia. Primeira lição é que o tempo melhor é o hoje, é este ano, todas as oportunidades que nos são oferecidas por Deus. Chegou, com Jesus, o tempo das núpcias de Deus com seu povo, e tudo se faz novo, muito mais do que os “janeiros” da vida! Se acertamos no tempo passado, demos graças a Deus. Eventuais falhas ou pecados, tudo seja lançado no mar da misericórdia de Deus. Aliás, as talhas das Bodas de Caná não eram propriamente de água potável, pois destinadas às purificações rituais. Dá para aproveitar a oportunidade e misturar a elas nossas sujidades! E vamos adiante! Como em nosso tempo pode acontecer, a festa estava para se tornar um desastre. Para aquele casamento e para nosso hoje, há alguém, Maria, com zelo de Mãe, capaz de descobrir, quem sabe numa visita à cozinha da casa, a falta do vinho, que na Bíblia é símbolo da alegria. Aquela que desde sempre foi o modelo da fé e da confiança, leva ao seu Filho as necessidades dos noivos, fazendo acontecer a hora de Jesus. Propósito para este ano será também a confiança na oração daquela que acompanha a Igreja, na peregrinação da fé, até a volta do Senhor. Em seguida, Jesus não se dirige aos donos da festa, mas aos servos, que sabiam das coisas. Quem serve pode recolher as águas da vida e encher as talhas. Quem não vive para servir não serve para viver! Já dá para perceber um novo programa a ser desenvolvido para este ano! E tudo é acompanhado e iluminado pela “receita de milagre”, oferecida por Maria: “Fazei tudo o que ele vos disser!” (Jo 2,5). Este é um propósito que pode ser um lema para este ano! Quem quiser transformar este tempo em milagre, pode até escrevê-lo em lugar visível em sua casa, comunicando à própria família.

Os Magos encontraram outros caminhos para retornarem à sua terra. Caminhos diferentes e mais seguros nós também poderemos percorrer, acolhendo a inspiração do Espírito que nos conduz. Depois do Batismo de Jesus, desencadeou-se sua vida pública, tendo passado primeiro pelo deserto (Mt 4,1-11) e ofereceu-nos os instrumentos para vencer as tentações do dia a dia. E os discípulos começaram a se achegar a Jesus, como desejamos ver outra vez neste Ano Vocacional da Igreja no Brasil. As Bodas de Caná manifestaram o tempo novo inaugurado por Deus, e seus discípulos creram nele. As festas de passagem e início de ano se estendam na alegria de viver, e os discípulos de hoje, todos nós, podemos fazer um roteiro de vida com os propósitos oferecidos pela Palavra de Deus que a Igreja nos dá de presente!

Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.

Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.

Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.

Dom Alberto Taveira Corrêa

Arcebispo Metropolitano de Belém

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