Em processos de aquisição de casa própria ou em outras transações comerciais que envolvem famílias, não é raro que as responsabilidades sejam assumidas pelas mulheres, mães que trazem sobre si tarefa de ser chefes de família, consideradas mais confiáveis. Em nosso Estado, mais de setecentas e trinta e quatro mil famílias são chefiadas pelas mães e não poucas vezes as avós, que também exercem a tarefa de pai.
Estes e outros dados apontam para uma mudança profunda nos papéis desempenhados pelos homens e pelas mulheres na sociedade. De um lado, a paternidade e a maternidade estão presentes em nossa natureza humana. Toda pessoa recebe esta missão, ainda que de formas diferentes. Ninguém nasceu para a esterilidade, mas todos nascemos para gerar, e não poderia ser de outro modo, pois somos imagem e semelhança de Deus, no qual estão presentes as características que no ambiente humano chamamos de paternidade e maternidade. E é o que de mais decisivo e maravilhoso Jesus nos contou a respeito de Deus: Ele é Pai que nos ama! Mas há uma crise na maternidade e de modo especial na paternidade.
A vocação paterna está em crise, o que leva a uma carência de lideranças maduras e corajosas no mundo. E quando faltam pais, idolatra-se a imagem de uma eterna juventude. Não basta ao homem ter filhos. É necessário assumir de forma madura o modo de amar, para ser pais. Constatamos a ausência dos pais: ausência física; ausência afetiva, com medo de expressar carinho e afeto; ausência normativa, que sejam claros em seus critérios e não temam estabelecer limites, homens capazes de amar com vigor, assumindo a masculinidade e os traços de ternura que o próprio Deus, forte e terno, plantou no coração.
Na Liturgia do quinto Domingo da Páscoa, há um pedido que pode soar ingênuo: “Filipe disse: “Senhor, mostra-nos o Pai, isso nos basta”. Jesus respondeu: “Filipe, há tanto tempo estou convosco, e não me conheces? Quem me viu, tem visto o Pai. Como é que tu dizes: ‘Mostra-nos o Pai’? Não acreditas que eu estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo, não as digo por mim mesmo; é o Pai que, permanecendo em mim, realiza as suas obras. Crede-me: eu estou no Pai e o Pai está em mim. Crede, ao menos, por causa destas obras.” (Jo 14, 8-11).
Bendita ingenuidade que nos aponta o essencial que é conhecer o Pai. Com frequência se afirma que é difícil conhecer a Deus como Pai porque os modelos de paternidade estão em crise na terra, quando, na verdade, é o Céu e a paternidade de Deus que vêm a ser acolhidos como modelo. É para o Pai Eterno que os pais da terra hão de levantar os olhos para contemplar o modo de viver aqui sua sublime vocação.
Para nosso consolo e formação, Jesus se mostra como aquele que é verdade e vida, a serem alcançadas passando pelo caminho para o Pai que é Ele mesmo (Jo 14,1-12). Tanto os pais, como as mães ou filhos ou qualquer pessoa que queira se realizar plenamente tem no relacionamento com Deus ponto de chegada, mapa, caminho, sustento.
Aos cristãos cabem responsabilidades irrenunciáveis. Não lhes é lícito viver como órfãos ambulantes, lamentando-se da vida. Sabendo ter Pai no Céu, vivem para gerar vida e relacionamento, cabendo-lhes sempre a iniciativa do serviço e do amor a todas as pessoas, sem exceção. Seu relacionamento com os outros é de transbordamento da vida plena que encontraram. A paternidade e a maternidade a serem restauradas no mundo são assumidas como tarefa por eles.
É próprio dos cristãos a paixão pela verdade, que abraçam com toda clareza e oferecem, sem violentar nem impor, dando razões da esperança que move seus corações a quem quer que seja. O caminho que percorrem é o do seguimento de Jesus Cristo, o Evangelho é sua luz e bússola segura. Sabendo que nasceram do amor eterno do Pai, ninguém lhes tira a alegria. Tais características da vida cristã não são privilégio de poucos. Antes, a todos os que foram batizados em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo é aberta tal possibilidade e entregue esta missão de restauração.
Para tanto, o caminho da conversão pede verdadeira violência interior positiva, segundo a recomendação do Apóstolo São Pedro (Cf. 1Pd 2,4-9): “Despojai-vos de toda maldade, de toda mentira, hipocrisia e inveja, e de toda calúnia. Como como pedras vivas, formai um edifício espiritual, um sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais, agradáveis a Deus, por Jesus Cristo. Vós sois a gente escolhida, o sacerdócio régio, a nação santa, o povo que ele adquiriu, a fim de que proclameis os grandes feitos daquele que vos chamou das trevas para a sua luz maravilhosa. Vós sois aqueles que antes não eram povo, agora, porém, são povo de Deus; os que não eram objeto de misericórdia, agora, porém, alcançaram misericórdia”. Nada de moleza e pusilanimidade! Antes, a coragem e a firmeza de quem edificou a casa de sua existência sobre a rocha, que é Jesus Cristo (Cf. Mt 7,24-27). Cada pessoa, no grande ou pequeno espaço que lhe cabe na vida, dê o primeiro passo!
Outra expressão do percurso a ser feito é a criatividade, responsabilidade e capacidade de decisões fortes. Diante do desafio da atenção aos mais pobres, as primeiras Comunidades Cristãs descobriram soluções inovadoras, como testemunha o texto dos Atos dos Apóstolos: “Reuniram a multidão dos discípulos e disseram: ‘Não está certo de que nós abandonemos a pregação da palavra de Deus para servirmos às mesas. Portanto, irmãos, escolhei entre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria, para que lhes confiemos essa tarefa. Deste modo, nós poderemos dedicar-nos inteiramente à oração e ao serviço da Palavra’. Escolheram então Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo; e também Filipe, Prócoro, Nicanor, Tímon, Pármenas e Nicolau de Antioquia, um prosélito. Eles foram apresentados aos apóstolos, que oraram e impuseram as mãos sobre eles” (Cf. At 6,1-7). A positiva multiplicação de pastorais e serviços existentes na Igreja expressa justamente esta disposição para mostrar a face de Deus, através dos frutos da Ressurreição do Senhor Jesus, Caminho, Verdade e Vida, postos à disposição pelo Espírito Santo que nos conduz.
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.