Durante muitos séculos Deus formou seu povo escolhido, dando-lhe leis e mandamentos justos, que proporcionaram a tantos homens e mulheres vislumbrarem a realização das promessas, na expectativa da plena realização do projeto do Senhor. Ao longo do caminho, muitas foram as lições e os corretivos feitos por Deus, através de seus enviados, em vista do amadurecimento na fé.
No doloroso e ao mesmo tempo fecundo caminho do deserto, a certa altura, como alguns homens não se encontravam no acampamento quando Moisés escolheu setenta deles, aconteceu que “Josué, filho de Nun, ajudante de Moisés desde a juventude, disse: ‘Moisés, meu Senhor, manda que eles se calem! Moisés respondeu: ‘Tens ciúmes por mim? Quem dera que todo o povo do Senhor fosse profeta, e que o Senhor lhe concedesse o seu espírito!’” (Nm 11,25-29). Era difícil ampliar os horizontes e deixar que Deus, em sua liberdade, enviasse seu Espírito a pessoas que não se encontravam em determinado grupo restrito.
No Evangelho, “João disse a Jesus: ‘Mestre, vimos um homem expulsar demônios em teu nome. Mas nós o proibimos, porque ele não nos segue’”. Jesus disse: ‘Não o proibais, pois ninguém faz milagres em meu nome para depois falar mal de mim. Quem não é contra nós é a nosso favor’” (Mc 9,38-43.45.47-48). Justamente João, que parece ter sido o mais jovem do grupo dos Apóstolos, tem uma visão fechada e restrita. Aquele que nos legou o Quarto Evangelho e cartas belíssimas, em que o Mandamento do Amor é amplamente colocado em relevo, teve que aprender muito!
A lição percorreu os séculos. Hoje, sabemos que Deus pode inspirar muitas pessoas, inclusive que pensam diferente de nós, e cabe-nos recolher o bem que existe, e bem é sempre bem, para identificar sementes do Verbo de Deus plantadas pelo Espírito Santo. Sugerimos inclusive um passo pastoral a ser dado pelas Paróquias, Pastorais e Movimentos, num processo de escuta e inclusão dos adolescentes e jovens, muitas vezes carregados de questionamentos, interrogações e até provocações! Nas diversas modalidades existentes, haverá sempre oportunidade de acolher as novas gerações, que são o futuro de nossa Igreja, de forma a se criar uma grande rede de atividades bem planejadas e realizadas em benefício de nossa juventude.
Entretanto, há poucos dias o Evangelho nos mostrava Jesus que acolhia e mostrava como referência uma criança, num tempo em que estas nem eram contadas! Por isso, a Catequese de nossas crianças, valorizando o período de maior abertura para Deus, não adie sua iniciação eucarística, para não permitir que outras fontes se instalem em suas mentes com compreensões inadequadas da vida e da fé. E grande se torna nossa responsabilidade de adultos para cuidar com dedicação e esmero de nossas crianças, sabendo que “se alguém escandalizar um destes pequeninos que creem, melhor seria que fosse jogado no mar com uma pedra de moinho amarrada ao pescoço (Mc 9,42).
Acrescente-se a isso, como boa educação da fé, a valorização dos pequenos gestos, pois reza assim a promessa do Senhor: “Em verdade eu vos digo: quem vos der a beber um copo de água, porque sois de Cristo, não ficará sem receber a sua recompensa” (Mc 9,41). Numa “conta” generosa e cheia apenas de amor, todos os gestos de serviço, atenção e caridade são considerados, e encontraremos no Céu santos e santas anônimos, cujas ações são vistas como aproximação dos valores do Reino de Deus. Nada e ninguém de tudo o que é feito por amor ficará esquecido por Deus, venham estas ações de onde vierem.
Se imaginarmos um grande lago criado por Deus, sobre o qual jogamos uma grande pedra, ao centro estão as grandes ondas, representando quem acolheu e vive o anúncio do Reino de Deus, seus valores e suas práticas. Ao meio do lago, encontram-se pessoas que humanamente e muitas vezes erradamente, julgamos apenas cristãos ocasionais, em frequência em festas como o nosso Círio que se aproxima, matrimônios, velórios e daí por diante. Não lhes falta, da parte de Deus, o mesmo amor eterno. De fato, assim se expressou em nome de Deus o Profeta Jeremias: “Com amor eterno eu te amei; por isso, guardo por ti tanta ternura!” (Jr 31,3). Lá na margem, onde as ondas perecem fraquinhas, está uma imensa multidão, os que muitos consideram últimos, ou piores, ou desprezados, aos quais chega o mesmo amor eterno. Os do centro ou do meio do grande lago hão de aprender o caminho missionário, para alcançar a todos, e ninguém seja ou se sinta excluído.
De nossa parte, é também hora de aceitarmos propostas radicais indicadas por Jesus: “Se teu pé te leva a pecar, corta-o! É melhor entrar na Vida sem um dos pés, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno. Se teu olho te leva a pecar, arranca-o! É melhor entrar no Reino de Deus com um olho só, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno, onde o verme deles não morre, e o fogo não se apaga'”. (Mc 9,45-48). Permito-me usar uma frase exigente e, ao mesmo tempo, geradora de muita vida, que abraço juntamente com muitas pessoas que desejam a vivência estrita do Evangelho: “Comigo, o máximo de exigência, com os outros, o máximo de misericórdia!” Assim, não jogaremos fora as sementes do Verbo de Deus que o Espírito Santo espalha no mundo!
Enfim, a prática do serviço e da caridade, que será o transbordamento das escolhas que fizermos, se deixarmos o Evangelho entrar radicalmente em nosso coração, com a partilha e a justiça proclamadas fortemente na Carta de São Tiago (Tg 5,1-6), que ouvimos neste Domingo, na qual a grande responsabilidade social dos que possuem muitas riquezas é como que balançada, em vista de uma conversão verdadeira. Se nos faltarem as forças para entender e praticar tudo isso, saibamos que lei do Senhor Deus é perfeita, conforto para a alma! O testemunho do Senhor é fiel, sabedoria dos humildes” (Sl 18,8).
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.