Engalana-se a terra paraense de flores caídas do Céu e nascidas da terra, num domingo de primavera permanente, quando se desdobra em sorrisos, abraços e gestos de acolhida, para que todos se sintam acolhidos. A Liturgia da Igreja, neste final de semana, providencialmente nos oferece um caminho de reflexão e a provocação positiva de gestos correspondentes aos frutos que desejamos para as grandes celebrações que nos envolvem.
Jesus está a caminho de Jerusalém, quando lhe vêm ao encontro dez leprosos, que suplicam compaixão e cura. São por ele enviados às autoridades encarregadas de comprovar a cura de tão grave enfermidade e um deles, apenas um, e samaritano, retorna a Jesus para agradecer. “‘Imola a Deus um sacrifício de ação de graças e cumpre teus votos ao Altíssimo’ (Sl 49,14). Louvar a Deus é fazer um voto de louvor e cumpri-lo. Por isto o samaritano se sobressai aos demais porque, ao ser purificado com os outros nove da lepra, pela palavra do Senhor, voltou sozinho a Cristo e engrandeceu a Deus com ação de graças. Dele disse Jesus: ‘Não houve dentre eles quem voltasse e desse graças a Deus a não ser este estrangeiro’. E dirigindo-se a ele: ‘Levanta-te e vai; tua fé te salvou’” (Lc 17,18-19). (Cf. Santo Ambrósio, Tratado sobre Caim e Abel, Li 1,9.34.38-39: CSEL 32,369.371-372).
No Círio de Nazaré, multiplicam-se aos milhões as pessoas que imolam a Deus sacrifícios de ação de graças e cumprem seus votos, conduzidos pelas mãos carinhosas de Nossa Senhora de Nazaré. Desejamos identificar a alegria estampada no rosto suado de tantos irmãos e irmãs que encontraremos nos próximos dias. Vale dizer que em todos estes anos de Círio todas as feições que temos a alegria de contemplar, mesmo quando na dor ou nos apertos nas grandes procissões, especialmente no domingo, sempre testemunham a ação de graças!
O Círio de Nazaré é festa! Nele se manifesta a oração em sua forma destinada a durar pela eternidade, o louvor! Sim, porque no Céu terão cessado os pedidos de perdão, as súplicas já estarão atendidas, passando para o Paraíso a Contemplação de Deus, na Comunhão com a Trindade Santa, na ação de graças perene e no louvor, com os anjos e os santos, entre os quais desejamos estar presentes! É o que pedimos na oração de consagração a Nossa Senhora de Nazaré: “Quero também te consagrar desde já, Senhora de Nazaré, o momento de minha morte quando, por tuas mãos e amparada pelos braços de teu esposo São José, poderei finalmente ver teu rosto, abraçar teu Filho Jesus e contemplar a glória do Pai, no amor infinito do Espírito Santo”.
Aqui, na terra do Círio, desejamos acolher os mais distantes! Sabemos que para tantas pessoas, a participação no Círio é uma das ocasiões privilegiadas, quiçá para muitos a única, de um contato com um evento de Igreja de tal porte. Dirigimo-nos a quem está ou se sente afastado da Igreja, por própria responsabilidade ou por culpa de outros. Dizemos diariamente a Maria: “Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores”! E aqui estamos todos incluídos e acolhidos, pois ninguém pode considerar-se justo diante de Deus. Todos somos acolhidos pela porta da Misericórdia! O manto aberto de Maria, Mãe e Mestra, abre-se para todos, sem exceção. Não é por ocaso que ela recebeu o título de Mãe da Misericórdia. A todos se dirija a mensagem do Papa Francisco para este Círio: “Ela nos ajude a guardar e meditar tudo, sem ter medo das provações, na jubilosa certeza de que o Senhor é fiel e sabe transformar as cruzes em ressurreições”.
Tantos enfermos acorreram a Jesus e todos foram bem recebidos e tocados com a graça. Diante deles, curou-lhes as doenças, desde as mais graves na época, como a hanseníase dos dez homens que dele se aproximaram, passando, por paralisias, cegueiras, encontrando surdos e mudos e tantas outras enfermidades. Ninguém passou em vão ao seu lado. Neste Círio, cheguem até o Senhor, conduzidos pelas mãos daquela que é chamada Saúde dos Enfermos, todas as pessoas que padecem em seu corpo, inclusive aquelas que carregam as sequelas da pandemia!
E nosso olhar se volta para os promesseiros da corda e do conjunto do Círio. Tanta gente nos afirmava ter promessas atrasadas a cumprir! Se, de um lado, queremos tranquilizar pessoas que tenham dificuldades para cumprir os votos e promessas, recomendando-lhes a conversa com um sacerdote, que pode ajudar a comutá-las, devemos reconhecer o imenso valor da palavra dada, transformada em ação de graças por graças recebidas, uma imensa multidão de pessoas que testemunham a certeza da intercessão amorosa de Nossa Senhora de Nazaré!
Nosso olhar se volta agora para a corda, ícone precioso de nossa devoção. Insistimos em ligá-la à palavra encontrada no Livro do Profeta Oséias: “Eu os envolvi com laços de amizade, eu os amarrei com cordas de amor; fazia com eles como quem pega uma criança ao colo e a traz até junto ao rosto. Para dar-lhes de comer eu me abaixava até eles” (Os 11,4). A corda nos liga à história do Círio e de nossas chuvas tantas vezes torrenciais, à união do povo para “guardar e proteger a santa”. Ela faz com que se prolongue a extensão da Imagem Peregrina e de seu manto, para chegar a todos os devotos. Assim, todos podem tocar e ver o Ícone da presença mariana entre nós!
Todas as imagens projetadas nos meios de comunicação fazem com que os olhos se voltem para a Berlinda, custodiada com dedicação pela Guarda de Nazaré e pela Diretoria da Festa de Nazaré. Cercada de flores e de carinho dos fiéis, ela pode ser vista de todos os lados. A Imagem Peregrina não está fechada e limitada por ela, mas significa a abertura de sua presença e testemunho para todos os lados. Nela, somos convidados a descobrir um símbolo do que nossa Igreja quer viver, indo ao encontro de todos, especialmente os mais pequeninos, os mais sofredores, os pecadores. Pedimos a Nossa Senhora, Mãe da Igreja, que este seja o Círio da Igreja de Belém aberta para todos, a fim de oferecermos nossa contribuição à sociedade, nosso mundo machucado e cansado, e nossas cidades se encham da alegria transbordante do mesmo Círio.
Para tanto, no final, mas não menos importante, nosso coração se volta para a mais simpática e jubilosa de nossas procissões, aquela que vê as famílias trazendo as crianças! Nenhuma família fique fechada em casa no domingo seguinte ao Círio! O lugar das crianças é na procissão! Venham todos limpar seus olhos com o sorriso lindo das crianças. Venham tornar-se crianças com os meninos e meninas. Venham iniciar seus filhos no conhecimento daquilo que é tesouro de nossa Igreja de Belém. Nenhuma criança cresça sem o Círio de Nazaré, para que nenhuma criança cresça sem se descobrir participante da Igreja. Com nossas crianças, abram-se as portas da Igreja para todas as gerações!
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.