“Ide, pois, fazei discípulos entre todas as nações, e batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-lhes a observar tudo o que vos tenho ordenado” (Cf. Mt 28,16-20). Por sua natureza, a Igreja é missionária. Cristo é o primeiro enviado, missionário do Pai (cf. Jo 20, 21), sua “testemunha fiel” (Ap 1, 5), e percorreu as nossas estradas de vida para anunciar a Boa Nova, sem rejeitar pessoas e situações. E todo cristão é chamado a ser missionário e testemunha de Cristo. A Igreja, comunidade dos discípulos, tem a missão de evangelizar o mundo, dando testemunho de Cristo, sua vida, paixão, morte e ressurreição por amor do Pai e da humanidade. É Cristo ressuscitado, aquele que anunciamos e cuja vida devemos partilhar. Os missionários de Cristo têm a honra de confessar Cristo, por palavras e ações, anunciando a todos a Boa Nova da sua salvação com alegria e ousadia, como os primeiros apóstolos. “A primeira motivação para evangelizar é o amor que recebemos de Jesus, aquela experiência de sermos salvos por ele que nos impele a amá-lo cada vez mais” (Evangelii Gaudium, 264).
Justamente o Terceiro Domingo da Páscoa nos introduz em temas ligados ao Batismo, que nos acompanharão daqui para a frente em nossa quarentena de preparação para a Páscoa. Jesus é Água Viva, Luz do Mundo, Ressurreição e Vida, acompanhados pela Mulher Samaritana, o Cego de Nascença e Lázaro com suas irmãs Marta e Maria. No centro está sempre Jesus, nosso Senhor e Salvador e a graça do mergulho na vida da Trindade, vivido em nosso Batismo, que nos faz discípulos missionários.
Não existe qualquer realidade humana nas Samarias da vida que seja alheia à atenção dos discípulos de Cristo, na sua missão. A Igreja de Cristo sempre esteve, está e estará “em saída” rumo aos novos horizontes geográficos, sociais, existenciais, lugares e situações humanas, para dar testemunho de Cristo e do seu amor a todos os homens e mulheres. Esta é a grande mística e a chave da vida da Igreja de Belém, para concretizar sempre mais o sonho do Papa Francisco: “Sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo atual que à autopreservação (Evangelii Gaudium, 27).
E é hora de olhar para Jesus Missionário, que se encontrou com pessoas de todo tipo! O episódio de seu encontro com aquela Mulher, à beira do Poço de Jacó, oferece-nos a oportunidade para buscar as consequências da tarefa missionária que assumimos como primeiro apelo em nosso Plano Arquidiocesano de Pastoral. Jesus Missionário, enfrentando a situação delicada de relacionamento com os samaritanos, considerados inimigos pelos judeus, ainda que compartilhassem com eles as mesmas raízes. E assim tomamos consciência de que as brigas religiosas não são de hoje!
A missão começa com um poço! Conversar sobre os assuntos do dia a dia, sem entrar em discussões religiosas. Apenas pedir um pouco d’água! Saber que o Reino de Deus está presente e todas as realidades da natureza e da vida humana apontam para ele. Nós também podemos ouvir ou envolver-nos em assuntos da vida cotidiana, orientando o diálogo para o bem e tudo o que existe de positivo. Aliás, diálogo começa quando estamos dispostos a ouvir o outro, e não o contrário.
Não é difícil perceber que a Samaritana está armada de preconceitos de origem religiosa e tribal. Jesus quer levar o assunto para a vida, a mulher volta para o tema do poço e a possível comodidade de não ter mais trabalho para ir buscar água. O Senhor puxa o assunto para o sentido da vida verdadeira! Sabemos que algum tempo depois ele mesmo dirá: “‘Se alguém tem sede, venha a mim, e beba quem crê em mim’ – conforme diz a Escritura: ‘Do seu interior correrão rios de água viva’” (Jo 7,37-38). Pouco a pouco Jesus começa a se revelar, “tirar o véu”, mas sua interlocutora, mesmo entrevendo tratar-se de um profeta, quer discutir religião, coisa que ainda acontece em nossos dias!
Jesus, antes do anúncio querigmático mais explícito, quer que a mulher se encontre com sua própria vida: “Ele lhe disse: ‘Vai chamar teu marido e volta aqui!’ – ‘Eu não tenho marido’, respondeu a mulher. Ao que Jesus retrucou: ‘Disseste bem que não tens marido. De fato, tiveste cinco maridos, e o que tens agora não é teu marido. Nisto falaste a verdade’” (Jo 4,16-18). Nada de dedo em risque para acusar! A confissão pública vem à tona naturalmente, como uma ponte para que a própria Samaritana se torne depois evangelizadora. Também aqui a história muitas vezes se repete, pois muitas pessoas, das quais humanamente não se esperaria muito, tornam-se porta-vozes do anúncio libertador de Jesus, justamente com o testemunho, que vem antes da doutrina explícita.
Jesus então amplia o horizonte da prática religiosa, fazendo arder o coração da Samaritana: “Vem a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade. Estes são os adoradores que o Pai procura. Deus é Espírito, e os que o adoram devem adorá-lo em espírito e verdade”. A mulher disse-lhe: ‘Eu sei que virá o Messias (isto é, o Cristo); quando ele vier, nos fará conhecer todas as coisas’. Jesus lhe disse: ‘Sou eu, que estou falando contigo’” (Jo 4,23-26). Conversa de água e poço, diferenças religiosas, vida de família, abertura de coração, anúncio do Salvador! Há muitos segredos prontos a serem contados, não como acusações, mas revelações maravilhosas, resultados da ação do Espírito que faz jorrar rios de água viva de onde menos se espera! Belíssimo roteiro missionário, a ser assumido em nosso tempo e nossa Igreja.
A Missão na Samaria se conclui quando a mulher, sem balde nem água de poço, corre à sua cidade: “‘Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz. Não será ele o Cristo?’ Saíram da cidade ao encontro de Jesus” (Jo 4,29-30). Anúncio feito, conversão realizada, e o Evangelho há de crescer de boca em boca, coração para coração: “Muitos outros ainda creram por causa da palavra dele, e até disseram à mulher: ‘Já não é por causa daquilo que contaste que cremos, pois nós mesmos ouvimos e sabemos que este é verdadeiramente o Salvador do mundo’” (Jo 4, 41-42). A água viva, nascida da rocha, pedra angular que é o próprio Cristo (Cf. Ex 17,5-7), continua a jorrar do coração de todos nós, quando aceitarmos estar assentados com Jesus ao lado de tantos poços e situações humanas, tantas vezes inusitadas! Renova-se assim, com a ajuda da Samaritana, o querigma missionário: O anúncio do Amor de Deus (Cf. Jo 4,23), a realidade do pecado (Cf. Jo 4,17.29), o anúncio de Jesus Cristo Salvador (Cf. Jo 4,26), a fé e a conversão (Cf Jo 4,29.41), o dom do Espírito Santo (Cf. Jo 4,23-24) e a Vida em Comunidade (Jo 4,28-42).
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.