“Há uma dificuldade para alcançar a alegria em nossos dias. A sociedade tecnológica multiplicou as ocasiões de prazer, mas encontra dificuldades para gerar a alegria. Isso acontece porque a alegria tem outra origem. Ela é espiritual. O dinheiro, o conforto, a higiene, a segurança material podem até não faltar, mas mesmo quando existem, o tédio, a aflição e a tristeza fazem parte da vida de muitos, levando algumas vezes até à angústia e o desespero, que nem o prazer existente em paraísos artificiais nem a aparente despreocupação conseguem evitar. Será que nos sentimos impotentes para dominar o progresso industrial e planejar a sociedade de uma maneira humana? Ou será que o futuro é demasiado incerto e a vida humana ameaçada? Ou não se trata de solidão, sede de amor e de companhia não satisfeita, um vazio mal definido? Ao mesmo atempo, em muitas regiões e tantas vezes bem perto de cada um de nós, acumulam-se os sofrimentos físicos e morais de forma opressiva. Tantas pessoas com fome, tantas vítimas de combates estéreis, tantas pessoas desabrigadas. Estas misérias talvez não sejam mais graves do que outras do passado, mas alcançam uma dimensão planetária. São mais conhecidas, ao ser difundidas pelos meios de comunicação, ao menos as experiências de felicidade. Mas tudo isso pode relaxar as consciências, sem que se encontrem soluções adequadas (Cf. São Paulo VI, Gaudete in Domino, 8). São palavras proféticas, escritas em 1975, mas atuais em nosso tempo e diante dos desafios existentes.
Papa Francisco volta a este tema na Exortação Apostólica Gaudete et exsultate, ligando-o à santidade e à prática das bem-aventuranças: “Sobre a essência da santidade, pode haver muitas teorias, abundantes explicações e distinções. Uma reflexão do gênero poderia ser útil, mas não há nada de mais esclarecedor do que voltar às palavras de Jesus e recolher o seu modo de transmitir a verdade. Jesus explicou, com toda a simplicidade, o que é ser santo; fê-lo quando nos deixou as bem-aventuranças (cf. Mt 5, 3-12; Lc 6, 20-23). Estas são como que o bilhete de identidade do cristão. Assim, se um de nós se questionar sobre «como fazer para chegar a ser um bom cristão», a resposta é simples: é necessário fazer – cada qual a seu modo – aquilo que Jesus disse no sermão das bem-aventuranças. Nelas está delineado o rosto do Mestre, que somos chamados a deixar transparecer no dia a dia da nossa vida. A palavra «feliz» ou «bem-aventurado» torna-se sinônimo de «santo», porque expressa que a pessoa fiel a Deus e que vive a sua Palavra alcança, na doação de si mesma, a verdadeira felicidade”. (Gaudete et exsultate 63-64).
A esta altura do Advento, a Igreja quer espalhar, mais uma vez, o anúncio da alegria. Sabemos que ela é fruto do Espírito Santo (Gl 5, 22) e vem a ser acolhida como dom, conquistada e testemunhada por todos os cristãos.
Podemos dar um exemplo, a partir de Abraão, cujo coração parece ter sido endurecido pela própria fé, quando estava para sacrificar o próprio filho. O seguimento estrito da Palavra de Deus, a paixão pela sua vontade dá coragem para tomar decisões difíceis e assumir posturas de firmeza! Durante o período de pandemia, quantas famílias choraram entes queridos falecidos, e foram muitas pessoas, e a situação foi gravíssima, sem dúvida. Entretanto, os meios de comunicação usaram e abusaram do tema do luto, quase como algo impossível de ser vivido e superado nas atuais circunstâncias.
Precisamos conviver com os nossos limites, com o percurso da vida humana, que tem também ela os seus limites. Sabemos várias coisas, uma delas é que ninguém vai ficar para semente, e também a escritura alerta que a vida humana vai até os setenta, fato notável quando chega a oitenta anos. É claro que aumenta a expectativa de vida em nosso tempo, os cuidados com a saúde cresceram e se aperfeiçoaram muito, mas tocaremos estes limites. Não será equilibrada uma reação, diante da morte, em que permanece o choro até cheio de amargura! Aproveito para alertar que a morte precisa ser vista também do lado de quem partiu, pois esta partida, a nossa fé assim ensina, é chegada à meta, é alcançar o que se buscou com fé durante a vida nesta terra.
A alegria pode chegar, e deve chegar à vida de todos os cristãos. O dever cumprido, a dignidade e seriedade no trabalho que nos cabe realizar, a consciência tranquila na vida cotidiana assumida de acordo com os mandamentos da lei de Deus. Tudo isso faz do homem e da mulher pessoas alegres e felizes, sem o cultivo de eventuais traumas ou complexos. Não somos perfeitos, mas estamos sempre caminhando rumo à meta, e isso é fonte de verdadeira alegria.
É bom estar atentos, pois nos são oferecidas muitas ocasiões de prazer. Se alguém passa o fim de semana num descontrole total dos próprios impulsos, a segunda-feira virá, no mínimo, com dor de cabeça, acompanhada de uma grande sensação de vazio. A graça do matrimônio e da vida conjugal, com a bênção de Deus no sacramento recebido, é fonte de alegria quando se permanece na fidelidade, que é mais exigente do que uma vida que alguém poderia chamar de livre, mas fonte de escravidão. A verdade do Sacramento indica que um homem e uma mulher haverão de se entregar mutuamente para a vida toda, e precisamos valorizar os testemunhos dessa vivência e anunciá-los às pessoas.
Fonte de alegria e felicidade é a capacidade de partilha dos próprios bens espirituais e materiais. Será feliz quem partilhar, olhando ao seu redor, especialmente com os mais pobres. Há mais alegria em dar do que em receber (At 20, 35) são palavras que os Atos dos Apóstolos atribuem ao Senhor, o que é verdade também comprovada pela nossa vida.
A alegria foi anunciada pelos anjos quando Jesus nasceu da Virgem Maria. Viver o Evangelho, acolher o Salvador, receber a alegria que é anunciada e doada, são fontes preciosas para nos mantermos com o sorriso autêntico nos lábios, com olhos brilhando de felicidade. Fechemos os ouvidos e os olhos nestes dias de preparação ao Natal do Senhor para todos os anúncios de maldade, violência, guerra e roubos. Mesmo que seja apenas no pequeno ambiente de nossa casa. Anunciemos que a alegria chegou, e veio para ficar!
Presidente da Fundação Nazaré de Comunicação, também é apresentador de programas na TV e Rádio e articulista de diversos meios impressos e on-line, autor da publicação anual do Retiro Popular.
Enquanto Padre exerceu seu ministério na Arquidiocese de Belo Horizonte – MG: Reitor do Seminário, Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Pároco em várias Paróquias, Vigário Forâneo, Vigário Episcopal para a Pastoral e Capelão de Hospital.
Foi Bispo Auxiliar de Brasília, membro da Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios do Conselho Episcopal Latino – Americano – CELAM. Tomou posse como primeiro Arcebispo Metropolitano de Palmas – TO. Atualmente o 10º Arcebispo Metropolitano de Belém.