As Transferências de Padres: Discernimento, Missão e Renovação na Igreja

A Igreja é, por sua própria natureza, um corpo vivo, em constante caminho e discernimento. Ao longo de sua missão evangelizadora, surgem desafios, necessidades e novos chamados que pedem escuta atenta, oração e decisões responsáveis. Nesse contexto, algumas ações pastorais podem suscitar dúvidas, questionamentos ou até inquietações no coração dos fiéis. Entre elas, estão as transferências de sacerdotes, que fazem parte da vida ordinária da Igreja e expressam seu dinamismo missionário, sempre orientado pelo cuidado com o bem das almas e pela fidelidade ao Evangelho.

As transferências podem ocorrer pelos mais variados motivos, uma vez que a dinâmica da vida da Igreja Católica e as necessidades pastorais exigem, constantemente, novas decisões, mudanças e realocações. Tais decisões não são atos arbitrários ou autoritários que recaem ou pesam sobre a pessoa de nosso Arcebispo.

As decisões e transferências são pensadas e construídas de forma colegiada, em um conselho formado por bispos e padres, o Conselho Presbiteral, e demandam longas conversas e, por vezes, diversas reuniões. É importante ressaltar, contudo, que as transferências de padres fazem parte da autoridade episcopal: trata-se do múnus (fundamentação canônica) do qual o bispo é revestido pelo sacramento da Ordem, no grau do episcopado, em comunhão com o Papa e a Igreja, e exercido também a partir de sua paternidade espiritual.

As leis da própria Igreja esclarecem os motivos das transferências de padres em uma diocese. O Código de Direito Canônico determina que:

“Se o bem das almas ou a necessidade ou utilidade da Igreja exigirem que o pároco seja transferido de sua paróquia, que dirige com eficiência, para outra paróquia ou outro ofício, o bispo proponha-lhe a transferência por escrito e o aconselhe a consentir, por amor a Deus e das almas” (Cân. 1748).

Segundo a legislação canônica, as transferências podem ser voluntárias ou por obediência, isto é, com o consentimento do sacerdote ou em virtude do voto de obediência ao bispo e a seus sucessores, juramento proferido no momento da ordenação sacerdotal.

Os frutos das renovações

As transferências são sempre uma oportunidade de renovação, tanto para os próprios sacerdotes quanto para as comunidades paroquiais, exigindo, por vezes, espírito de sacrifício e obediência. É o Senhor quem, por meio do Espírito Santo, indica esse caminho, iluminando e abençoando os irmãos na nova missão que lhes é confiada:

“O Espírito da Verdade vos conduzirá à verdade plena, porque não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que ouvir” (cf. Jo 16,13).

Outro motivo que leva o sacerdote a acolher com amor uma nova missão é o desapego. Trata-se de uma atitude humana e saudável, ainda que, ao longo do tempo — curto ou longo — de permanência em uma paróquia, se construam amizades fortes e vínculos importantes. No entanto, é fundamental recordar que o padre não é “seu” nem “nosso”, mas pertence à Igreja, à Arquidiocese, sendo colaborador dos bispos. Isso não é arbitrariedade, mas faz parte da própria natureza da vocação sacerdotal e episcopal.

O Direito Canônico prevê uma certa estabilidade para o pároco (seis anos, renováveis por mais seis), mas isso não significa que ele não possa ser transferido antes desse período. Durante esse tempo, podem surgir novas necessidades ou situações que levem o Conselho Presbiteral a repensar sua permanência naquela comunidade. Os motivos dessas decisões não precisam ser tornados públicos; são discernimentos que permanecem no coração dos bispos. Os sacerdotes transferidos, o Arcebispo, os bispos auxiliares ou o próprio Conselho não têm a obrigação de expor pessoas ou justificar publicamente as razões das transferências. Não é necessário explicitar os motivos; basta que eles existam.

A justificativa de que um padre é bom, querido, está há pouco tempo na paróquia ou realizou um bom trabalho é válida e louvável, mas os critérios para as transferências são mais amplos. A vida paroquial envolve um leque diverso de responsabilidades, competências e interlocuções. Ninguém é plenamente apto para todas as demandas. Por isso, avalia-se a permanência ou não de um sacerdote a partir de critérios que ultrapassam o aspecto afetivo ou prático. Especialmente nas paróquias onde o padre atua sozinho, sem vigários, exige-se múltipla atenção e uma atuação pastoral variada. Esse aprendizado nem sempre se dá no lugar onde o sacerdote se encontra no momento. Assim, as transferências sucessivas contribuem para o amadurecimento dos presbíteros e para novas experiências nas comunidades.

A mudança, portanto, tende a gerar frutos para todos: para o padre e para a comunidade. Ela abre horizontes, convida à revisão de relações, modos de servir e processos pastorais. Ninguém goza de estabilidade indefinida, nem mesmo os bispos. Essa consciência ajuda o clero a rever posturas, hábitos e relações. Quando um sacerdote é dotado de grandes qualidades e competências, a ponto de gerar crescimento e alegria em uma comunidade, ele não pode ser “possuído” por ela como um bem inalienável. Outros lugares também necessitam de seus dons. Ele pode ser o pastor de que uma comunidade vizinha precisa, diante de suas demandas pastorais, espirituais, administrativas e humanas.

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